terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Transcrição do filme ESTAMIRA

ESTAMIRA

Um filme de Marcos Prado


  • Ganhou premio de melhor documentário na França – 2005
  • Melhor documentário em vários outros pequenos prêmios, júri público, e jornalistas;
  • Melhor longa metragem
  • Melhor fotografia
  • Melhor documentário – Rio 2004
  • Melhor documentário – S. Paulo-2004
  •  

A MISSÃO

“A minha missão, além de eu ser Estamira, é revelar a verdade, somente a verdade: Seja a mentira, seja capturar a mentira e tacar na cara... ou então, ensinar a mostrar o que eles não sabem.” 
Os Inocentes

“Não tem mais inocente. Tem “esperto ao contrário”. Esperto ao contrário tem, mas inocente não tem não...  Vocês é comum, mas eu não sou comum não. Só o formato que é comum. Vou explicar tudinho pra vocês agora:
Cegaram o cérebro, o gravador sangüino, e o meu eles não conseguiram, porque eu sou formato gente, carne, sangue, formato homem, par, eles não conseguiram!... A bronca  deles é essa!... do trocadilo!... trocadilo, amaldiçoado,excomungado, hipócrita, safado, canalha, indigno, incompetente... Sabe o quê que ele fez?  Mentir pros homens, seduzir os homens, cegar os homens, incentivar os homens e depois jogar no abismo...(...) Foi isto que ele fez. Porisso que eu to na carne, sabe pra quê?  Pra desmascarar ele, com a quadrilha dele todinha. Eu derrubo!.. Derrubo,  ele sabe que eu derrubo (...) quer me desafiar? É ruim, heim?
Ele é tão poderoso ao contrário, que eu, até depois de a carne, velhinha desse jeito, feia desse jeito, boba desse jeito... ele ainda quer mais!...   Ai, ai!... é mole? Que bobo, rapaz!...

Ó lá, os morros, as serras, as montanhas, a paisagem, e Estamira!...  Estamar...Estasserra...Estamira está em tudo quanto é canto...tudo quanto é lado... até meu sentimento mesmo vejo... todo mundo vê Estamira!... 
(Instrumental)

Felizmente, nesse período que eu comecei a revelar e cobrar, a verdade, sabe oq eu é que acontece?  felizmente, tá quase todo mundo alerta.  Erra só quem quer.

(Instrumental) 
O lixão: A descarga

Isto aqui é um depósito dos restos. Às vezes é só resto. E às vezes vem também o descuido. Resto e descuido.

Quem revelou o homem como  o único condicional, ensinou ele  conservar as coisas. E conservar as coisas é proteger, lavar e limpar. E usar mais, o quanto pode. Você tem sua camisa. Você está vestido, você está suado: você não vai tirar a sua camisa e jogar fora... Você não pode fazer isto. 
Quem revelou o homem como o único condicional, não ensinou a trair, não ensinou a humilhar, não ensinou a tirar....ensinou a ajudar...

Miséria, não. Mas as regras, sim. Economizar as coisas  é maravilhoso, porque quem economiza, tem.  Então as pessoas têm que prestar atenção no que eles usam, no que eles têm, porque “ficar sem”, é muito ruim.

O trocadilo fez de uma tal maneira, que quanto menos as pessoas têm, mais eles menosprezam, mais eles jogam fora, quanto menos eles têm!...

Eu, Estamira, sou a visão de cada um.  Ninguém pode viver sem mim. Ninguém pode viver sem Estamira (fazendo um jogo de palavras com “mira” e “visão”!...). Eu me sinto orgulho e tristeza por isto. Porque eles, os astros negativos, ofensível, eles sujam os espaços, e querem... e querem...e sujam tudo.

A Criação

A criação toda é abstrasta: os espaços inteiros são abstratos, tudo é abstrato, Estamira também é abstrata.

Visivelmente, naturalmente, eu tenho a impressão de que se eu desencarnar, eu tenho a impressão que eu serei muito feliz. E talvez eu poderei ajudar alguém. Porque o meu prazer sempre foi esse: ajudar alguém, ajudar um bichinho.
 Tem 20 anos que eu trabalho aqui. E eu adoro  isto aqui. A coisa que eu mais adoro é trabalhar. 
(...) 
DEFINIÇÃO DO UNIVERSO:

Tem o eterno, tem o infinito, tem o além, e tem o “além dos além.”. o além dos além vocês ainda não viram. Cientista nenhum ainda viu o além dos além . 

CONCEITO de PÓS-MORTE

Sabe de uma coisa? O homem, depois que ele fica visível, depois que ele nasce, ele, depois que desencarna, a carne, se for pro chão, derrete,  fica só os ossos, os raios, cabelos. E aí ele fica formato, a mesma coisa, mas só que fica transparente. Meu pai está perto de mim, minha mãe, meus amigos...
A gente fica formato transparente, e vai... vai, como se fosse um pássaro... voando...  Ó, lá em casa eu vejo é muito, vai muito, lá em casa.(...)

EM CASA:

(dialeto de Estamira). 
HISTÓRIA:

Eu nasci dia 07 de abril de 1941. A carne e o sangue. O formato. Formato homem, par. Mãe e avó.  E aí então, sabe o que que aconteceu? eles levaram o meu pai em 1943. Aí... nunca mais o meu pai voltou!...
Meu pai chamava eu de tanto nomezinho... chamava eu de uns nome engraçado: “merdinha”... neném... fiinha do pai...
Aí então, depois, sabe o que eles falaram? Depois eles falaram que o meu pai morreu. E aí então minha mãe ficou pra cima e pra baixo, pra cima e pra baixo comigo.... Que judiação, não? Coitada da minha mãe, mais pertubada do que eu.  Bem, eu sou pertubada, mas lúcido, e sei distinguir a pertubação. Mas coitada da minha mãe não conseguia.  Mas também, pudera, eu sou Estamira!... Se eu não dou conta de distinguir a pertubação, eu não sou Estamira...eu  não era...eu  não seria. 

( “ intervenção do real radar... verificar...)

CONTROLE REMOTO - DEFINIÇÃO

E ainda tem... ah o controle remoto.
Tem o controle remoto superior, natural, e o controle remoto artificial.
O controle remoto é uma força quase igual, assim mais ou menos, igual à luz,  à eletricidade.. é o seguinte: na carne e no sangue, tem os nervos.  Os nervos da carne sangüínea vêm a ser os fios elétricos. Os deuses, que são os cientistas técnicos, eles controla, eles vê aonde eles conseguiu. Os cientistas, determinados, trocadilos, eles conseguem porque o controle remoto não queima: torce. O cientista tem o medidor que controla, igual o ferro, que tem os números: tem pra lã... tem pra... é... é simples, né? 
(...) 
Passei menos mal depois daquele dia. Mas depois voltou a atacar... Aqui ó, torcia... o controle remoto mesmo, é a força... a câmara artificial, que faz mal do caralho... é na costela, é em tudo quanto é lugar  (... ai...)  até na cabeça.
O controle remoto tudo é um só. Esse controle remoto, tem o artificial e o natural.
(...) agora,  tem o registrador de pensamento, você já viu? Não?! Puxa vida!... é a mesma coisa que... “eletroesferograma”...
Escutou? (som de trovoada)... Trovão!...Ih, é mesmo!...  lá vem o relâmpago. Lá em casa ele sai de baixo da cama, e  ( imita  o som do relâmpago e do trovão, simulando uma tempestade, e se diverte com isto). 
 NATAL DE 2001 

O natal pra mim, tudo que nasce é natal. E ainda mais essa confusão misturada com o sofrimento de Jesus... Eu não tenho nada contra o homem que nasceu, entendeu, prá eles o que era bom era o deus, depois eu revelei quem é deus, porque felizmente eu posso, sem prevaleção, sem repugnância, com muito orgulho, com muita honra, Estamira, Eu. Posso revelar, revelei porque posso, porque sei, consciente, lúcido e ciente, quem é deus, o que significa deus e outros mais. Ó, cê, quer saber? Eu não tenho raiva de homem nenhum.  Eu tenho é dó. Eu tenho raiva, sabe de quê? Do trocadilo!...do esperto ao contrário, do mentiroso, do traidor. Eu tenho raiva, ódio, nojo!... 
(tempestade)

Jesus correu e escondeu inderna de  antes de nascer.O jesus que eu conheço como Jesus, filho de Maria, filho de Israel, filho de rua... eu já tive dó de Jesus, mas eu não tenho mais dó. Eu já tive dó de escravo, não tenho mais dó de escravo também não. (...)
Me chamaram de Jesus, me chamaram de sangue de barata, de sangue de cazuza, me chama de Maria que é a mãe de Jesus... que deus é esse? Que jesus é esse? Quê que é isso?  (...)

Se eles acham que eu sou feiticeira, eu sou feiticeira... mas não sou feiticeira falsária, nem perversa não... mas eu sou ruim, perversa eu não sou. Mas ruim eu sou... Sou ruim e não vou deixar de ser ruim. Sem perversidade na cobrança... na cobrança. Mas eu conto até 3, eu conto até 10, eu tenho o controle superior.  (... interagindo com a tempestade, como se a estivesse desafiando, ou invocando, Estamira dá um grito antes de rugir o trovão. Tempestade, chuva, vento... Estamira permanece no meio da tempestade e do lixo, como se fosse este o seu nicho ).
  
 NOÇÃO DE INFERNO – UTILIZANDO OUTRA DENOMINAÇÃO 

O além do além é um transbordo. Você sabe o que é um transbordo?  Bem... é toda coisa que enche, transborda.  Então, o poder superior, o real, a natureza superior contorna tudo pra lá, pra'quele lugar. Assim como as reservas, tem as reservas nas beiradas, ninguém pode ir lá, e aqueles astros horroroso, irrecuperável, vai tudo pra lá, não sai de lá mais nunca. Pra esse lugar que eu to falando, o além do além, lá pr'as beiradas, muito longe, muito longe, muito longe..., sangüino nenhum pode ir lá... Vocês não vai entendendo de uma vez só, que eu sei. Porisso que eu ainda estou aqui, visível, formato homem, par. Homem par, não to falando homem impar. Formato homem ímpar, é vocês. Formato par é a mãe; a mãe é formato par, e os ímpar, é o pai.

( tempestade: Estamira “briga” com o seu pai astral)

Eu transbordei de raiva... transbordei de ficar invisível...com tanta hipocrisia, com tanta mentira, com tanta perversidade, com tanto trocadilo... Eu, Estamira...

As doutrinas erradas, trocadas, ridicularizou os homens... ridicularizou as m... é isso mesmo, ele vai me pagar... faz o  homem expor ao ridículo pra eles, fez o homem ficar pior do que “quadrupulo” ... então que deixasse os homens como fosse antes de ser revelado como o único condicional!... 
(...)

Daqui a 2 dias, isso aqui já  ta cheio... eu não gosto de falar lixo não, mas vamos falar lixo... é cisco, né?  É caldim, disso, é fruta, é carne, é plástico fino, é plástico grosso, é não-sei-o-quê-lá mais... e aí vai azedando, é laranja... é isso tudo...e aí faz espoqui, e aí imprensa, azeda, fica tudo danado, e faz a pressão, e aí vem o sol e esquenta, mais o fogo de baixo... e aí forma o gás, o  gás carbônico, que serve pra cozinha, prá qualquer coisa, mas ele é forte, ele é branco... Quem não consegue, tem gente que não se habitua com ele, não dá conta, é  tóchico, (cf sua pronúncia). Felizmente,  graças aqui, eu tenho aquela casinha lá, aquele barraco. Eu acho sagrado, o meu barraco, abençoado, e eu tenho raiva de quem fala que aqui é ruim. Saio daqui, eu tenho pra onde descansar.  Isso aqui é que é a minha felicidade. 

CAROLINA

Ela é igualzinha ao pai, a cara!...

“Meu pai era aquele cara grosso, temperamental, mas, bom, ele era bom, e gostava muito dela, eles brigaram muito” ( Estamira chama a atenção do neto para não furar o pé no prego) . 
“Apesar de parecer gostar muito dela, mas ele tinha outros casos, outras mulheres. Era uma vida, né, uma vida de verdade. Aqui, vivendo nesta vida, a gente tem que se esforçar pra ela (...) continuar vivendo porque eu não acredito que  ela esqueceu tudo, eu acho que ela vive nesse  mundo é pra esquecer o que já viveu.  Errou muito, ele, mas como ele não está aqui pra se defender, a gente não pode falar nada”
-Enquanto você estiver aqui, ele está – diz Estamira, acendendo um cigarro.
-Mas mesmo assim, sangue é sangue, pai é pai... ele morreu eu gostando dele...

Quando eu fui pra Goiás, sabe o que aconteceu?  2 PM pra bater em mim, porque eles queriam que eu aceitasse Jesus no peito e na raça, e deus, no peito e na raça.
-Ela é contra Jesus e contra Deus!...
-E você? Eu não sou contra, presta atenção!...
-Mamãe, cada um tem um ponto de vista!...
- Ponto de vista porra nenhuma, deixa de ser otária!... ainda ta com isso ainda? Lê essa porra aí, deixa de ser otária, abestalhada!.. (Estamira joga um livro dos Testemunhas de Jeová para Carolina)

Jesus, nem se... eu não sou contra ele, eu tenho dó dele, eu conheço ele, “inderna”desde antes dele nascer... desgraça de tanta burrice, tanta teimosia, eu não falei com vocês no hospital? ( Estamira pergunta  para o cinegrafista )
-Mãe, eu to falando que eu tenho o meu ponto de vista e você tem o seu!.
-Que ponto de vista? Tem ponto de vista errado!
-A senhora gosta de rosa e eu gosto de amarelo, e aí?
- Que gosta de rosa e amarelo o quê!... cor não tem nada a ver com isso!...
Eu sou obrigada a gostar do rosa da senhora? A senhora gosta de uma coisa e eu gosto de outra coisa
- Quem falou que eu não gosto dele? Só não é isso que vocês pensam!...

-Mas a senhora...
-Não é isso que vocês pensam!...
-A senhora sabe o que eu penso, por acaso? A senhora não sabe o que eu penso!...
- Esse livro aqui é Testemunha de Jeová!... ( entra o filho, Hernane)
-Ele já leu um bocadinho... de cada um tira um conto- Ah, mas eu leio muitos livros... eu leio de todas as igrejas, aí eu posso tirar uma conclusão... eu aprendo assim, de acordo com a fé que Deus me deu...
- caiu!... caiu!... caiu, ta viciado, caiu!...
- bíblia fala...
-Que bíblia? Papel aceita até levar no banheiro... papel não tem defesa!... ainda mais quando as pessoas usam o nome de deus pra fazer piada...
-pra debochar
-“stopa”, “stopa” com esse argumento porque senão a gente vai até amanhã de manhã!...
(Estamira sai rindo, e Carolina sussurrra:)
- Ela não é louca, mas ela não é completamente 100%, vê? Ce vê o que ela fala?  (...)
-Ela precisa de um tr...
-Deus me livre, mas ela morrerá muito mais feliz se for no meio da rua, do que numa clínica... ela prefere viver 2 anos livre, do que viver 5 anos, bem, trancada num lugar, você sabe disso...
- Mas você não está me entendendo. Eu não vou dizer que ela vai ficar toda a vida, o resto da vida, ela vai ficar até pelo menos ela... entendeu?  Porque eu acho mais que o problema dela é o “sistema nervoso”.
-Só que pra ela ficar lá, teria que ser dopada, amarrada. Pra mim, ele é mais forte que eu, nesse caso. Se tiver que dopar e amarrar, é com ele mesmo... eu já não... não tenho  coragem de deixar...

(...)

LÁ FORA

Ta dando controle remoto aqui ...( arroto) ...  ta vendo? 

CAROLINA

-Ela vivia com meu pai numa casa boa, meu pai era mestre de obra, ganhava razoavelmente bem, tinha uma kombi, uma belina,.. ela andava com pecinha de ouro, eu também tinha, bastante, que meu pai dava...
Vivia bem com ele, mas o meu pai judiou muito dela, com traição, levava mulher até para dentro de casa, dizendo que era colega...
Aí ela não aceitou, começou a brigar, a xingar ele, ele puxou faca pra ela, ela puxou pra ele, aquela brigarada toda, aí botou ele pra fora de casa. Aí de lá começou uma luta, né!...

(...)

A culpa é do hipócrita, mentiroso, esperto ao contrário, entendeu? Que joga pedra e esconde a mão.  Do qual, antes de ontem eu tive um abriga com o meu próprio pai. Meu pai astral. O sr. Ouviu? O  toró!... O sr. Sabe o que é que era o toró?  Eu ( bate no peito) estava brigando com o meu pai... astral.

(...) 
APÓS UMA RODADA DE CACHAÇA NO LIXÃO:

-Se eu não fosse casada, e esse sr. Não fosse casado, eu casava com esse sr!...  ( o homem, amigo de Estamira repete  o mesmo)
- Eu já casei muitas vezes, já, to separado...não quero saber mais de mulher não. Prefiro ficar sozinho e Deus
- Tocar punheta!...
- Isso, tocar uma punheta que é melhor!...
-“ Colombina, onde vai você... eu vou dançar o iê-iê-iê!...”  (canta Estamira)
(...)

-Eu te amo... mas vc é indigno, incompetente, e eu não te quero nunca mais... eu lamento... eu te amava... eu te queria... mas você é indigno, incompetente, otário, pior do que um porco sujo, divirta-se, faça à vontade, que eu prefiro o desprêzo... Ande, nunca mais encostarás em mim...             ( Estamira pronuncia estas palavras após cantar em falsete e em idioma confuso, uma música que mais se parece um lamento). 
CAROLINA

-Minha mãe, quando trabalhava no Jardim Gramacho, logo quando ela começou, ela passava 2 semanas, às vezes uma semana, dormindo ao relento, às vezes em barraca, às vezes ao relento mesmo lá em cima, lá na rampa, depois ela vinha pra casa, tomava banho, ficava toda bonitinha... depois voltava de novo e assim ia...Ficou 5 anos assim. Eu e meu irmão um dia chamamos ela: “mãe, sai dessa vida lá no lixão... lá é difícil, as pessoas têm que dormir no relento... e coisa e tal. E conversamos, é perigoso achar um negócio, fura você, te contamina... ela quis sair.  Aí ela foi trabalhar no Mar e Terra ( um superrmercado que foi posteriormente comprado pela Sendas) . E quando ela saía, dia de sexta-feira ou sábado, ela se reunia com os colegas (...) e aí ia parar pra beber uma cervejinha, e na hora de ir embora, cada um ia pro seu canto, e ela vinha sozinha. Aí foi estuprada uma vez no centro de Campo Grande, foi estuprada uma segunda vez aqui nessa mesma rua que eu moro... na época não tinha nem luz aqui... ela falou que o cara fez sexo anal com ela, ela gritando: “para, pelo amor de Deus”  -“Que Deus, esquece Deus...” o estuprador falava pra ela, e fez sexo com ela de todas as formas que quis com ela, e depois mandou ela ir embora.
Aí ela chorava, contava, chegou em casa muito revoltada, né. Nesse tempo, ela não tinha alucinação, não tinha pertubação nenhuma, muito religiosa, e acreditava que Deus ia... que quilo que ela tava passando era uma provação.
Começou a alucinação assim: ela começou a chegar em casa e falar assim: “D. Maria, ce sabe que quando eu cheguei lá no meu quarto hoje pra trabalhar, alguém tinha feito um trabalho de macumba pra mim... agora cê  vê se eu acredito nessas coisas, nessas palhaçadas, o pessoal ao invés de trabalhar para adquirir as coisas...” aí pisou na macumba, jogou a tal da macumba fora, fez não sei o que lá mais... “Eu vou acreditar nessas coisas nada, que Deus me protege, Deus é tudo... é Deus que me guia e me guarda...”
Aí um mês depois  começou: “Ó, tem gente, eu tenho a impressão de que tem gente do FBI atrás de mim... eu tenho a impressão de que quando eu pego o ônibus, tem alguém me filmando dentro do ônibus, eu não sei pra quê, com câmera escondida”.
Um dia ela sentou lá no quintal da minha sogra e aí olhou... olhou... olhou... e falou:  “ isto aqui é o poder, isto que é tudo que é real...”
Daquele dia em diante eu acho que ela desistiu mesmo de Deus, agora é só “eu”, e só “eu”, e o poder dela e acabou...

(...)

Trocadilo, safado, canalha, assaltante de poder, manjado, desmascarado  (cuspe).
Me trata como eu trato, que eu te trato. Me trata com o teu trato, que eu te devolvo o teu trato. E faço questão de devolver em triplo.  Onde já se viu uma coisa desta? A pessoa não pode andar nem na rua que mora, nem trabalhar dentro de casa,  e nem em trabalho nenhum, em lugar nenhum...
Onde o senhor (...), que deus é esse, que Jesus é esse?  Que só fala em guerra, e não sei o quê, não é ele que é o próprio trocadilo? Só pra otário, pra esperto ao contrário, bobado, bestaiado... quem já teve medo de dizer a verdade, largou de morrer? Largou? Quem anda com deus dia e noite, noite e dia na boca, e ainda mais com deboche, largou de morrer?  Quem fez o que ele mandou, o que o da quadrilha dele manda, largou de morrer? Largou de passar fome?  Ah!... não dá!...
Não adianta, ninguém, nada vai mudar  meu ser. E eu sou Estamira, aqui, ali, lá... no inferno, nos inferno, no céu, no caralho, em tudo quanto é lugar, não adianta, quanto mais essas desgraças, esses piolhos de terra suja, amaldiçoado, excomungado,, que renegou os home como o único condicional, mais ruim eu fico, mais pior eu sou. Perversa eu não sou não, mas ruim eu sou. E não adianta. Antes de eu nascer eu já sabia de tudo. Antes de eu estar com carne e sangue, é claro, se eu sou a beira do mundo. Eu sou Estamira. Eu tô lá, eu tô cá,  eu to em tudo quanto é lugar. E todos dependem de mim. Todos dependem de Estamira. Todos. E quando desencarnar vou fazer muito pior.

(...) 
HERNANE

-O sr. Leopoldo, falecido Leopoldo, quando tava vivo, o italiano, meu pai de criação, não deu dinheiro nenhum pra ajudar a minha mãe não.  Então eu fiquei ligando a semana toda pra esses hospitais que tratam da cabeça das pessoas, pra ver se tinha vaga pra poder internar ela. Eu tinha combinado com ele assim: Fui no hospital de Caxias. Fui primeiro com o “Velho”, com o carro dele, aí consegui uma ambulância. Aí fomos pra lá pra o lixão. Aí chegou lá até os bombeiros tava com medo de encostar a mão nela, porque  ela queriamorder e começava a gritar nome de entidade de macumba, e daquele jeito, chega espumando, parecia um bicho mesmo, gritando. Aí pegaram uma corda e amarraram ela, com a mão pra trás assim, enrolada. Aí fomos pra o hospital de Caxias.  Chegou lá, a menina falou assim: “ não, aqui não dá pra internar que aqui não tem messe tratamento”. Tinha que levar pra Engenho de Dentro.  Aí fomos pra Engenho de Dentro  (...).   Os que entrar ali não saem. Só com a autorização do responsável.  Aí comecei a preencher a ficha. Aí não quis aceitar, mesmo com os bombeiros lá falando , conversando. Aí tivermos que voltar e le4var ela pra Caxias de novo, aí mandaram eu esperar ela acordar. Quando ela acordou, eu falei: “mãe, vamos embora”, ela já veio me mordendo... Aí eu falei: “O que é que eu posso fazer?” e deixei ela lá... 

A desgraçada da família itália, juntamente com aquele meu filho, me pegaram aqui dentro, como se eu fosse uma fera, um monstro, algemado. E aquele meu filho que ficou contaminado pela terra suja, pelo baixo nível, pelo insignificante, parecendo um palhaço lá dentro do hospital... a coisa mais ridícula!...

Eu não vivo por dinheiro. Eu faço dinheiro. Eu não faço, é você que faz. Eu não vivo pra isso, ou por isso. ‘Cê ta vendo eu fazer?  Entendeu agora?

Controle remoto atacou. Desde manhã. A noite inteira pertubando, os astros negativos, ofensível, eles ‘tão “pelejando” pra ver se atinge uma coisa que chamam de coração meu, ou então a cabeça... eles ‘tão “fudidos”!... Tão poderoso ao contrário, o hipócrita, safado, traidor, mentiroso, manjado, desmascarado... ele se mete com a minha carne visível, com a minha camisa sangüina, carnívora... Estamira... ele ta “fudido” comigo, até pra lá dos “isquinto” dos infernos!...

(...)

Aí eles descarregarma uma coisa muito importante aqui, que é o de comer: enlatados, conservas... amanhã, por causa disso, eu vou preparar uma bela duma macarronada... macarrão, lá eu já tenho... ‘Xô ver o que que é isso...
Agora, no momento, eu não sei nem o nome disso aqui... Mas  é conserva.  É preparado lá fora... E boa. Aqui, isso também eu ponho no... eu  coloco purinho: palmito. Veio uma carga muito boa, olha, ta vendo? Eu ponho no molho de macarrão, também... E às vezes fica até melhor do que no restaurante... Pra quem sabe preparar, né.

Tem o lúcido, que dá aquele que eu escrevi lá. Tem o lúcido doente aqui. Tem o ciente... tem o ciente. O ciente é o saber. Do qual, Jesus não sabe ler nem escrever, mas ele aprendeu toda coisa, de tanto ele ver, o lucidar.
“... atua lucidez não te deixa ver...” ( verso de um pagode famoso no Rio de Janeiro).
A inlucidez e a lucidez (repete). E o sentimento, né. Consciente, lúcido e ciente. E tem o sentimento. O que fica colhendo, gravando, é o sentimento. Agora, por exemplo, sentimentalmente,  visivelmente e invisivelmente, formato transparente, conforme eu já lá te disse  (... parece entrar em transe)... eu estou num lugar bem longe... num espaço bem longe... Estamira ta longe... Estamira ta em todo lugar... estamira podia ser irmã ou filha ou esposa de espaço, mas não é... espera que eu já tô descendo... Ó lá, ó onde eu estou...Eu estou aqui e estou lá...

Vocês não aprendem na escola, vocês copiam. Vocês aprendem é com as ocorrências. Eu tenho neto com 2 anos que já sabe disso. Tem o de 2 anos, ainda não foi na escola. Hipocrisias, mentiras e “charlatage”.

Em seguida Estamira passa a pronunciar palavras e letras como se estivesse se comunicando através de um rádio amador, e depois fala em dialeto, simulando uma briga e depois um papo agradável. Em seguida, se despede com um “tchau”.

EM 13/03/2001 ESTAMIRA DIRIGE-SE AO CAPS DE NOVA IGUAÇU

Estamira sem carne, Estamira invisível, vê e sente as coisas todinhas. Porisso que eu sou Estamira.tem vez que eu fico pensando: mas eu não sou um robô sangüino, eu não sou um robô. Eu falei pra Drª Alice que minha cabeça tem hora que parece que dá até choque assim: “tiiimmmm.... tiiimmm!...” Não dói não, dá agonia, dá choque, bate assim igual a onda do mar: “Tcháaaa!... igualzinho a onda do mar..
- há há há há há.... (gargalhada de desprezo) ... A drª passou remédio pra raiva... há há há há há há...
E eu fiquei muito decepcionada, muito triste, muito... profundamente com raiva dela...falar assim uma coisa daquela?  Ela ainda disse, sabe o quê? Que Deus livrasse ela!... que isso é magia, telepatia, “amide”, e o caralho... pô, pra que,  ela me ofendeu demais da “contera”...
Aqui ó, ó, o retorno...,daqui a 40 dias... Presta atenção nisso... Olha, e ainda mais, eu conheço médico, médico, médico...direito, entendeu?
Ela  é copiadora... eu sou “amigo” dela, eu gosto dela, quero bem a ela... quero bem a todos, mas ela é copiadora... eles estão fazendo, sabe o quê? Dopando, quem quer que seja, só com remédio!... não pode, o remédio... quer saber mais do que Estamira? Presta atenção, o remédio, é o seguinte:
Se fez bem, para, dá um tempo. Se fez mal, vai lá, reclama, como eu fiz,  3 vezes. Na quarta vez  que eu fui atendida. Mas eu não quero o mal deles não... eles estão copiando... o tal de Diazepan então... se eu sou louca, visivelmente, naturalmente, eu fico mais louco...  entendeu agora? O tal de Diazepan... não, eles vão lá e só copiam. Uma conversinha pra cá, e só copiar, e tome!... Ah, isso não pode não sr.!... como é que eu vou ficar... todo dia, todo mês, cada marca... e eu vou lá “panhar” o mesmo remédio? Não pode, é proibido... além... além... não pode... entendeu agora? Eu não estou brincando, eu estou falando sério, aqui ó, ‘cê vê como é que é o remédio...  e aí eu devolvi a ela porque ela, os viciados deles, porque não sou eu, às vezes pode precisar... está aqui, porque na faculdade do exército, como eu fui operada aqui, ó, entendeu? Eles me deram o remédio... eu fui lá, na faculdade de Botafogo, faculdade do exército, em Botafogo, e devolvi na farmácia, falei com o médico, e devolvi. Porque eu não estava precisando deste remédio. Quem sabe sou eu... quem sabe é o cliente... fica se viciando...dopando, vadiando, pra Terra isso não é o  (...) sua excomungada, desgraçada,  (...), manjada, desmascarada, desgraçada...
Aí, ó, tudo que ela passou pra mim, eu bebi. A quantia, os limites, toda coisa tem limites, esses remédio são da quadrilha da armação do dopante, pra cegar os homens, pra querer deus... deus falsário, entendeu? Esses remédios são dopantes, pra querer deus falsário,  entendeu? Ela falou que deus livrasse ela, o trocadilo é ela.

MARIA RITA

(relato da mãe de criação da filha de Estamira)

“Mais ou menos há 12 anos atrás eu já era motorista de caminhão e era voluntária de um hospital.  E aí eu conheci uma pessoa, uma senhora muito bacana, e um dia ela chegou lá em casa com essa menina pequenininha pelas mãos e falou assim: ‘Ângela, eu tenho um presente para você’.  E aí eu falei:  ‘não vai me dizer que é essa coisinha aí...’  ela falou: ‘é esse bichinho do mato aqui que eu to trazendo para você cuidar...’ Aí eu falei assim: ‘de onde ela saiu?’  Aí ela me contou a história da menina, que a menina vivia na rua com a mãe, que a mãe catava lixo, e que o irmão dela, o mais velho, não queria aquela vida pra menina. Aí ela falou: ‘Vou marcar uma reunião com os irmãos dela para eles te conhecerem,  porque há um impasse: a irmã quer botar a menina num colégio interno, o irmão, acha que ela deve ir pra uma casa de família, para ela ter um lar’. Mas o irmão era o mais velho, decidiu o que deveria decidir... e tudo bem, fiquei com a menina. Até aí então eu só ouvia falar da Estamira: que ela era de rua, que era mendiga, que catava lixo, que vivia disso... e aí um ano depois começou a levar a menina pra mãe ver. O encontro foi dramático demais, a menina tremia  igual vara verde, quando viu a mãe, aí eu falei pra mãe que... eu tive que mentir pra mãe pra ela me respeitar um pouco, não querer tomar a menina, né, que a gente tinha aquele medo ainda. Até eu falei pra mãe que eu era assistente social de um colégio interno do governo,e que o juiz que me deu posse da menina, de tirar a menina da rua, inventei uma historinha, com o consentimento do Hernane, pra a mãe acreditar e não querer levar a menina de volta.  Ela queria muito uma família, um lar, então ela se adaptou com muita garra a nós, muita garra mesmo...”


-Maria Rita, entra aqui!...
-Boa tarde!...
-Boa-tarde, “cara do pai”!... (beijo). “Trem” bonito!... Uai, mas porque é que demorou  desse tanto?
-O carro enguiçou!... A srª  tá bem, mãe?
-Tô!...

Olha, pra mim, que vivi lá em Jardim Gramacho, é um local de trabalho...  Sei lá, eu tenho uma imagem um pouco macabra daquele lugar lá onde eu vivi, porque eu vivi muita coisa... e a maioria da parte de que vivi lá foi ruim... Eu era uma que catava entre os lixos... eu tinha uns 6 anos...  eu fui morar com essa minha madrasta eu (...) tava fazendo 8... e era horrível, tinha que pedir... pedir muito, trabalhava muito pra conseguir um sanduíche. É muito triste, porque eu saí de perto da minha mãe, meu irmão me tirou... e eu já com a cabeça... já cresci pensando em ajudar ela...  e ela é um pouco difícil de querer se ajudar...  e eu, sinceramente, se eu pudesse, não teria saído de perto da minha mãe, não...  mas, se “aquele” Gramacho continuar, pode contar que ela vai querer continuar lá.

-Vamos preparar o macarrão?
-vamos preparar o macarrão!...
-Eu vou ser sincera, queria cozinhar igual à minha mãe...
-Hum?
-Ela cozinha  bem!...
-Não chega a tanto!...

Minha mãe  tá com medo do mundo, porque ela falou uma vez assim pra mim: que acha que  Deus não existe,. E quando fala em Deus ela fica nervosa... eu acho que um determinado tempo da vida dela que se apagou dentro dela. A fé, o que falta na minha mãe é a fé.

HERNANE:

- eu acho que, o que ela entende como o real poder, que Deus é a posição, que é supremo...
-deus porra nenhuma, não sabe nem o que quer dizer “deus”!...
-no livro de Gênesis fala:  ( Hernane passa a ler um longo trecho da Bíblia, enquanto Estamira se irrita lá na cozinha)
- Que tristeza!...( continua xingando e vai para fora de casa) Esse palhaço, abobado!... Inferno!... vai pro céu, vai ´pro caralho!... covarde!... vai pra desgraça, pro caralho!... vai tomar no cu, abestalhado!... abestalhado, covarde...  Dentro da minha casa!... dentro da minha casa, pô!... Eu não caguei essa casa não!...  Não foi cagado não!... foi trabalhado, suado, dia e noite, no sol e na lama!... vai pr’o céu, vai pr’o caralho... vai tomar no cu!... baixo nível imundo!... Esse é o resultado de... que coisa, não?
-Bom, Shalon, Adonai!...( diz Hernane e sai calado, sem responder nada)

-esses pastor tudinho é vigarista... vagabundo... todos eles, pior do que os padres...    absoluta, consciente, lúcido e ciente... absoluta!...
Sou doida, sou maluca, sou avogada, sou essas 4 coisas... mas porém, consciente, lúcido e ciente... e sentimentalmente.  Só comecei a revelar em ’86, a revelar de verdade mesmo, porque era muito abuso. Porisso é que eu estou aqui revelando que o cometa ta na minha cabeça.  Sabe o que significa a palavra “cometa”?  Comandante!... comandante natural. Comandante. Então, conforme eu tava (... dialeto). A constelação (...) todo meio... ( nesse momento Estamira parece estar “fora de órbita”).
Eles ficaram com raiva do cometa. Determinados astros perversos, astros negativos, ta com raiva do cometa porque o cometa achava que ele não deveria procurar uma carcaça como a minha. Procurar uma carcaça como Maria israelense, mãe de Jesus, que concebeu Jesus  filho de Davi carvalhense...(...) ... aaaiiii !!( Estamira geme de dor, um gemido que vem lá das entranhas, e pode-se perceber que ela sofre muito). Mantenha o controle... mantenha o controle...
O cometa é grande... é porisso que eu passo mal... a carcaça, a carne, porque ele é muito grande... ele não é do tamanho que vocês vêem. Daqui ele não é lá no alto espaço, não...lá no alto espaço é o reflexo... ele é aqui embaixo, ele não é lá em cima não... ele é aqui embaixo... é lá onde ‘cês vêem o reflexo... a lua é lá no morro acolá... Não é lá assim não... é o reflexo... é o contorno... aaaaaiiiiiii!!! Mantenha o controle... mantenha o controle...

(...) 

Isso aqui é um disfarce de escravo...escravo disfarçado de liberto... a Isabel soltou eles, e não deu emprego pros escravos... passam fome, comem qualquer coisa, como animais, não têm educação... aí então, é muito triste...

(Natal de 2001)

Foi combinado: “Alimentai-vos o corpo, com o suor do próprio rosto”.  Com sacrifício. Sacrifício é uma coisa, trabalhar é outra coisa. Absoluta!. Eu, Estamira, que vos digo, ao mundo inteiro e a todos: trabalhar não; sacrificar.
( ...)

Todo dia ele deita lá( Estamira refere-se ao companheiro do lixão, de copo e de infortúnio, que ajeita-se para dormir perto do fogo aceso). E quando não deixa ele deitar lá, com medo de ele queimar, ele acha ruim.  Eu fico com dó demais, ele é muito bom. Ele sabe ler e escrever muito, e mesmo assim acontece essas coisas. É o trocadilo que fez isso com as pessoas.  O homem não pode ser incivilizado. Todos os homens têm que ser iguais.  Tem que ser comunista. Comunismo é igualdade. Não é obrigado todos trabalhar num serviço só, não é obrigado todos comer uma coisa só, mas a igualdade é a ordenança que deu quem revelou o homem como o único condicional. E o homem é o único condicional, seja que côr for. Eu sou Estamira, eu não importo.  Eu podia ser da cor que fosse.  Eu, formato Homem, par, mas eu sou Estamira, mas eu não admito, eu não gosto que ninguém ofende cores, nem formosura.  O que importa, bonito, é o que fez e o que faz.  Feio é o que fez e o que faz. Isso é feio. A incivilização é que é feio. Comunismo superior. O único comunismo.

(...)

Eu, Estamira,  visível e invisível, eu tenho muitos sobrenomes...

























segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

A resolutividade das oficinas terapêuticas nas unidades básicas de saúde


RESUMO: O movimento denominado Reforma Psiquiátrica, iniciado na década de 80, e que vem sofrendo gradativas transformações, tem se tornado o pivô do cenário atual em que se constitui ou deveria constituir o atendimento psicológico nas unidades básicas de saúde.  Através dela o manicômio ou sanatório passou a ter seus dias contados, e o direito à convivência familiar e comunitária, embora criticado por muitos, passou a ser uma realidade cada vez mais comum e diretamente observável e perfeitamente exeqüível, em qualquer que seja a camada social. Através das oficinas terapêuticas, esses pacientes passam a ter uma rotina saudável, com possibilidades reais de aprendizagem de um ofício que garantir-lhes-á,  pelo menos, a ocupação do seu tempo de forma terapêutica e saudável. 
PALAVRAS-CHAVE: Oficinas terapêuticas; atendimento psicológico; transtornos mentais; medida psicoprofilática, valorização social do usuário.

Introdução  
Após quase 05 anos de atuação em unidade básica de saúde, observo que as oficinas terapêuticas, importante estratégia de cuidado em saúde mental e que propõe a valorização do sujeito portador de sofrimento psíquico através do seu meio social, cada vez mais demonstram se constituir no melhor instrumento de atenção aos pacientes dos psicólogos das unidades básicas, assim como aos seus familiares: elas têm proporcionado aos profissionais de saúde mental maior facilidade em conhecer melhor o paciente, otimizando seu tempo de avaliação e tratamento. 
 Diante da impossibilidade de operar de forma diferente do que tem acontecido, dado o enorme contingente à espera de atendimento psicológico (que, na maioria das vezes trata-se apenas de fazer orientações aos pais de crianças e adolescentes, já que estes geralmente não apresentam perfil de usuários da psicologia em centros de saúde) e do escasso número de profissionais à disposição – no grande Maracanã, por exemplo, são aproximadamente 40.000 moradores, estimando-se em 10% de pacientes em potencial, para apenas 01 profissional atender – as oficinas terapêuticas se configuram em recurso adicional de primeira linha, já que elas possibilitam um diagnóstico completo, rápido e ao mesmo tempo, na terapêutica adequada, dependendo do caso.  

O perfil dos pacientes das oficinas terapêuticas  

Durante as avaliações, seja nos atendimentos individuais ou em grupo nas atividades das oficinas terapêuticas, percebe-se que há maior procura por parte de pacientes ditos depressivos, mas que muitas vezes encontram-se em situação, dir-se-ia, transitória . A parcela referente aos adultos, especificamente os pacientes de transtorno mental importante em atendimento, é muito menor do que na verdade pode-se supor. Nas oficinas terapêuticas, a maior freqüência observada é das “donas tristes, e crianças levadas” (Linha-Guia em Saúde Mental). Aí provavelmente se explica o fenômeno interessante que vem ocorrendo nos atendimentos feitos através das oficinas terapêuticas: o alto nível de rotatividade de pacientes ditos depressivos e o nível insignificante de recorrentes. Por outro lado, a freqüência e constância dos pacientes egressos da Policlínica Helio Sales e de outras instituições é significativa e seu nível de participação tem se mostrado desejável, em ambos os sentidos: no do comparecimento e do empenho nas atividades que exercem.  
A resolutividade das oficinas terapêuticas 

O fato de as oficinas terapêuticas se configurarem em importante e adequada estratégia de atendimento em saúde mental nas unidades básicas, abrangendo desde os portadores de ansiedades leves até as esquizofrenias e outros tipos de sofrimento psíquico, pode favorecer a uma grande camada da população. Os que sofrem de depressões menos graves e que superlotam os centros de saúde, aumentando as filas em busca de uma consulta médica, devido às somatizações, conseguem em pouco tempo reduzir a ansiedade e dar lugar a outros pacientes, criando uma rotatividade que se supõe ser desejável: em pouco tempo, o paciente consegue se perceber melhor, se entrosar melhor com os outros membros de sua família, e isto pode ser suficiente para reduzir a sua ansiedade, acarretando, daí, importante economia para os cofres públicos, ao prevenir gastos desnecessários com especialistas, que na maioria das vezes observam  inexistência de organicidade nas queixas apresentadas.  
Conclusão  
Necessário far-se-ia, pois, que houvesse empenho e investimento mais significativo por parte dos gestores municipais nas atividades das oficinas terapêuticas, com a contratação ou remanejamento de artesãos atuantes em outras secretarias, aquisição de maquinários e materiais específicos para as oficinas terapêuticas. É necessário também o treinamento com profissionais psicólogos e de outras formações, principalmente aqueles que ainda resistem à essa estratégia, embora ela tenha se mostrado suficientemente adequada. Pode-se afirmar que as oficinas terapêuticas se configuram, dentre outros itens, em importante medida psicoprofilática, considerando as ansiedades comuns do dia-a-dia, que, tratadas precocemente, podem vir a ser anuladas de forma plena e consistente, diminuindo as filas em busca de consultas médicas e requisição de exames que geralmente se apresentam normais. Reside aí o caráter preventivo das oficinas terapêuticas em relação aos transtornos emocionais na esfera das neuroses ditas leves, que poderão causar maiores sofrimentos tanto para o paciente quanto para seus familiares, e gastos desnecessários para os cofres do município.  
Referências  
1-     Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais– Linha-guia em Saúde Mental  
2-     Projeto: Cada doido com sua mania, disponível em http://www.cdsm.ufes.br/oficinas.html, acesso em 25/10/08
3- Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à
Saúde – DAPE. Coordenação Geral de Saúde Mental. Reforma Psiquiátrica e Políticas de Saúde Mental no Brasil. Documento apresentado à Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental. 15 anos depois de Caracas. OPAS. Brasília, novembro de 2005.

 
  
 

Sobre Estamira...

Esta extraordinária mulher é a prova viva de que, em fragmentos de lucidez  e inteligência acima do padrão, característicos de quem é portador de transtornos mentais como a esquizofrenia, é possível pensar por conta própria, diferente do que acontece com 99,99% da população, por assim dizer. O que mais me deixou encantada nesta mulher foi a lucidez com que ela denuncia o descuido, ou seja, por conta de uma sociedade capitalista, quem é pobre é largado ao léo,  tratado como alguém quem não tem  a mínima importância. É uma denúncia direta, e pode ser considerada  praticamente  como reivindicação para que sejam criadas políticas de cuidado, aos seres humanos economicamente desfavorecidos, de forma que eles não se transformem em "resto", que é como se sentem, ao terem que frequentar os lixões existentes por este mundo.