Recordações de infância
reportam-me ao programa de rádio, de nome “GIL GOMES DIZ”. Tratavam-se de relatos do cotidiano da Grande São
Paulo/SP, sempre regados a sangue, engodos, vinganças, etc. Gil Gomes
conseguia captar a essência do ser
humano que costuma cometer atos similares aos
relatados, e conseguia empregar ainda mais teatralidade às histórias
cuidadosamente escolhidas. Minha mãe não perdia um. Ela se assustava e se
admirava sobre a capacidade do ser humano de cometer tais crimes, diariamente
relatados.
Hoje, em vez de rádios, temos programas de TV
inspirados em Gil Gomes. São centenas deles, espalhados por todos os cantos do
país. Tomando como exemplo o Cidade Alerta, podemos depreender que se trata de
uma preparação psicológica para o ódio, dirigida ao telespectador, que
assistiria a relatos e vídeos de comportamentos violentos podendo mentalmente
visualizar sangue correndo como se proviesse de Veias Abertas, na nossa América
Latina.
Esse tipo de programa – de
que se pode falar que “se torcer, sai sangue”, tem no seu cerne o mesmo que
qualquer novela: a crueldade. Esse tipo de programa só dará ibope se contiver
personagens cruéis (vilão) e suas vítimas (mocinhos sofredores).
É disso que vivem os
programas de entretenimento em TV, rádios, publicações de revistas, jornais, e
afins, já que felicidade não dá ibope, salvas raríssimas exceções. O que é
gritante em programas policiais é que o apresentador expele ódio por todos os poros,
sem se importar com o fato de que os protagonistas dos fatos relatados ainda
são seres humanos, e como tais, carregam falhas das quais muitas vezes não têm culpa.
Curioso observar que esses apresentadores têm potencial para arrastar pessoas
que geralmente são de boa índole nesse ódio introjetado e sem fim.
A neurofisiologia humana dá
conta de que existe uma vasta “... complexidade do sistema de regulação da
função cerebral, que envolve vários neurotransmissores...” (Neury José Botega).
Se esses transmissores não estiverem atuando corretamente o ser humano
provavelmente apresentará patologias das mais diversas naturezas, que poderão
resultar em comportamentos denominados como marginais: estupros, estelionatos,
roubos, homicídios e outros, em que a capacidade de empatia está ausente.
Como se trata de avidez pelo
lucro exorbitante, os capitalistas da comunicação não pensam duas vezes para
expor e execrar em rede nacional uma pessoa que comete crime, mas que ainda é
um ser humano, sujeito de direitos.
Em vez de espumar de ódio em
frente às câmeras e microfones, estimulando a audiência incauta e distraída a
fazer o mesmo, esse apresentador deveria chamar atenção das autoridades
competentes para o fato de que aquele não é um caso de polícia, e sim,
provavelmente, de saúde pública, devendo ser a ele conferido outro tipo de
tratamento, e não o que a ele é conferido.
Referências
Botega NJ. Crise Suicida:
Avaliação e Manejo. Porto Alegre:
Artmed; 2015
Galeano, Eduardo. As Veias
Abertas da América Latina. Rio de
Janeiro: Paz e Terra; 1979
Teles, Ronny. Canal Ronny Teles. Live
do dia 19/08/2020 . Youtube ( minutos 43 a 46) Acessível em https://youtu.be/G0C5y4Ao1gY
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