quinta-feira, 20 de agosto de 2020

A Função dos programas policiais da mídia


 

Recordações de infância reportam-me ao programa de rádio, de nome “GIL GOMES DIZ”. Tratavam-se  de relatos do cotidiano da Grande São Paulo/SP, sempre regados a sangue, engodos, vinganças, etc. Gil Gomes conseguia  captar a essência do ser humano que costuma cometer atos similares aos  relatados, e conseguia empregar ainda mais teatralidade às histórias cuidadosamente escolhidas. Minha mãe não perdia um. Ela se assustava e se admirava sobre a capacidade do ser humano de cometer tais crimes, diariamente relatados.

 Hoje, em vez de rádios, temos programas de TV inspirados em Gil Gomes. São centenas deles, espalhados por todos os cantos do país. Tomando como exemplo o Cidade Alerta, podemos depreender que se trata de uma preparação psicológica para o ódio, dirigida ao telespectador, que assistiria a relatos e vídeos de comportamentos violentos podendo mentalmente visualizar sangue correndo como se proviesse de Veias Abertas, na nossa América Latina.

Esse tipo de programa – de que se pode falar que “se torcer, sai sangue”, tem no seu cerne o mesmo que qualquer novela: a crueldade. Esse tipo de programa só dará ibope se contiver personagens cruéis (vilão) e suas vítimas (mocinhos sofredores).

É disso que vivem os programas de entretenimento em TV, rádios, publicações de revistas, jornais, e afins, já que felicidade não dá ibope, salvas raríssimas exceções. O que é gritante em programas policiais é que o apresentador expele ódio por todos os poros, sem se importar com o fato de que os protagonistas dos fatos relatados ainda são seres humanos, e como tais, carregam falhas das quais muitas vezes não têm culpa. Curioso observar que esses apresentadores têm potencial para arrastar pessoas que geralmente são de boa índole nesse ódio introjetado e sem fim.

A neurofisiologia humana dá conta de que existe uma vasta “... complexidade do sistema de regulação da função cerebral, que envolve vários neurotransmissores...” (Neury José Botega). Se esses transmissores não estiverem atuando corretamente o ser humano provavelmente apresentará patologias das mais diversas naturezas, que poderão resultar em comportamentos denominados como marginais: estupros, estelionatos, roubos, homicídios e outros, em que a capacidade  de empatia está ausente.

Como se trata de avidez pelo lucro exorbitante, os capitalistas da comunicação não pensam duas vezes para expor e execrar em rede nacional uma pessoa que comete crime, mas que ainda é um ser humano, sujeito de direitos.

Em vez de espumar de ódio em frente às câmeras e microfones, estimulando a audiência incauta e distraída a fazer o mesmo, esse apresentador deveria chamar atenção das autoridades competentes para o fato de que aquele não é um caso de polícia, e sim, provavelmente, de saúde pública, devendo ser a ele conferido outro tipo de tratamento, e não o que a ele é conferido.

 

Referências

Botega NJ. Crise Suicida: Avaliação e  Manejo. Porto Alegre: Artmed; 2015

Galeano, Eduardo. As Veias Abertas da América Latina. Rio de  Janeiro: Paz e Terra; 1979

Teles, Ronny. Canal Ronny Teles. Live do dia 19/08/2020 . Youtube ( minutos 43 a 46) Acessível em https://youtu.be/G0C5y4Ao1gY

 

 

 

 

 


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